quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Deu no Olheiros - Saída de jovens ocorre cada vez mais cedo

É impossível saber de tudo.
Saber do Inglês, do Argentino, do Feminino e ainda acompanhar Brasileiro, Mineiro, Paulista, Libertadores - loucura!
Entretanto, não é por falta de informação.
Nós, jornalistas, sofremos é com o tempo.
Notícia tem, informação de qualidade e credibilidade também.
Conheci o Olheiros.net através do colega Gabriel Dudziak.
Conhecer o mundo das categorias de base, saber da formação dos jogadores é o objeto de estudo e trabalho deles.

O novo ataque dos tubarões
Lincoln Chaves - 27/12/2010

"Tubarões brancos" é o novo apelido dado aos clubes da Premier League em geral, instituido pelo diretor de futebol do Feyenoord, Leo Beenhakker, revoltado com a saída de uma das grandes promessas do clube holandês, o zagueiro Nathan Ake. Irritação que se dá principalmente porque Ake tem apenas 15 anos, e é o quarto jogador local a deixar o país nos últimos anos para atuar no futebol inglês, após Jeffrey Bruma, também zagueiro e que rumou ao mesmo Chelsea, e os meias Oguzhan Özyakup e Kyle Ebecilio, que foram para o Arsenal, causando a ira de seus clubes.


O caso de Ake mostrou que, por mais que nos últimos tempos até tenham surgido algumas ações com o intuito de frear os avanços dos gigantes europeus, especialmente os ingleses, a realidade a curto prazo não tende a ver grandes modificações. Os euros engordando a conta bancária do garoto e de sua família e a ilusão criada pela possibilidade de atuação na milionária Premier League acabam sobrepostos ao que muitas vezes é pouco levado em consideração: a notória parca utilização de jovens jogadores na liga inglesa, principalmente em times como o Chelsea, onde o dinheiro de Roman Abramovich ainda é mais acionado no mercado que as canteiras azuis.

A retaguarda não é das melhores, e o caso da ida de Gael Kakuta ao - novamente - o Chelsea é bastante ilustrativo. Os Blues conseguiram retirá-lo do Lens antes que assinasse um contrato profissional com o clube francês, revoltando os dirigentes "logrados". O Lens inicialmente conseguiu uma punição ao jogador e ao time inglês, que ficaria sem poder contratar jogadores por uma temporada. No entanto, o Tribunal Arbitral do Esporte reviu a decisão e, considerando que o contrato de formação dos franceses com Kakuta era irregular, avaliou que a negociação com o Chelsea não havia impedimentos. Brecha aberta para que os "ricaços" da Premier League avancem.

Por sua vez, em março, uma decisão do mesmo Tribunal veio para tentar diminuir o ímpeto por esse avanço das ligas grandes às promessas das ligas menores. A medida veio após o Lyon vencer uma batalha judicial com o Newcastle sobre o já aposentado Olivier Bernard, a quem os franceses acusaram os Magpies de "roubar". Por essa decisão, o clube formador deveria ser ressarcido caso perdesse um atleta antes de este ter um contrato profissional, com o intuito de seguir incentivando a investir no trabalho de base - uma das preocupações ponderadas pelo Tribunal -, além de limitar o enfraquecimento de outras ligas do continente.

Algo, porém, que em curto prazo - e Nathan Ake está aí para mostrar - não terá grandes avanços. Principalmente porque, embora preveja esse pagamento e que ele seja referente ao período que o garoto esteve na base do clube do qual saiu, a norma não é precisa no que diz respeito a valores. O Chelsea, por exemplo, depositou apenas pouco mais de 270 mil euros ao Feyenoord pela jovem promessa. Uma quantia irrisória, inferior a diversos salários pagos mensalmente no próprio clube e longe do investido pelos holandeses. Isso porque, em um futuro próximo, Ake pode estar ainda mais valorizado, e os 270 mil euros se configurarão de vez em "preço de banana".

Também para "conter" esse avanço, foi criada na Premier League a medida que obriga os clubes a ter oito, em seus 25 atletas, formados em casa, ou que tenham defendido o time por pelo menos três temporadas antes de completar 21 anos. O objetivo, em tese, era o de colaborar para a abertura de espaços a mais jovens talentos forjados na Inglaterra. Acontece que se por um lado, a longo prazo, a norma pode até ter algum resultado, por outro ela naturalmente intensificou a busca das equipes por garotos em outros centros, como Holanda e França. Algo que, por sua vez, também tem sua eficiência em ajudar na formação de jovens ingleses questionada.

Acontece que se as medidas extracampo ainda encontram dificuldade em chegar a um denominador comum, os clubes precisam começar a fazer a sua parte. A começar pelo relacionamento com os garotos e suas famílias. Não somente sob a ótica financeira, mas nas condições de educação e treinamento que colaboram, inclusive, para incluir cada vez mais o jogador à cultura da agremiação. Um tato que, por exemplo, faltou ao Feyenoord. Basta dizer que Ake era o principal interessado em aceitar o convite do Chelsea, convencido pelos sonhos propiciados pelos londrinos. Com o OK da família, a equipe de Roterdã ficou sem saída.

Alguns clubes ainda contam com algum sucesso nesse aspecto. O Sporting, de Portugal, costuma ter jovens de sua base, reconhecida como uma das mais bem estruturadas e formadoras da Europa, observados por times de fora, principalmente ingleses. No entanto, tem se saido bem na manutenção destes valores, pelo menos até suas profissionalizações - ainda que os negocie mal. Em solo inglês, há o caso do Crewe Alexandra, cujo tato da comissão preparada pelo italiano Dario Gradi é decisivo para que o pequeno time da quarta divisão do país consiga manter jovens com potencial até estes se tornarem profissionais. Dean Ashton é um desses exemplos.

Outra questão é a criação de projetos de carreira, em moldes semelhantes ao que o Santos tenta fazer por aqui, com o estabelecimento de metas e benefícios. É, porém, um trabalho que necessita do supracitado bom relacionamento entre clube, jogador e familiares, para que tais medidas sejam adotadas sem que sejam um "tiro no pé", criando inimizades e rivalidades entre os atletas da base. A partir destes projetos, o clube tem a seu favor a possibilidade de que o garoto opte por crescer no futebol de uma maneira menos ilusória e mais planejada, em detrimento à "aventura" no notoriamente difícil desafio de se conseguir espaço em um time principal de Premier League.

A globalização é um fenômeno irreversível e o futebol há muito é um negócio, lapidado cada dia mais cedo, além da liga inglesa ser - com justiça, diga-se - o grande sonho de consumo de qualquer garoto. O problema é que o descontrole do processo de caça a promessas e a disparidade entre campeonatos antes mais parelhos coloca, a cada dia, em risco maior grande da renda e do apelo comercial do futebol em muitos países - inclusive no Brasil, que vibrou como se fosse título quando Neymar esnobou a proposta milionária do Chelsea. O desafio não está limitado às normas, mas também à mentalidade dos clubes. E em ambas as partes, o tempo urge para que novas ações se mostrem efetivas.

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